sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O ACHADOR DAS PIROGAS DE LANHESES


        Anda um cidadão despreocupado entretido na pesca da lampreia nas águas cristalinas do rio remansoso, perscrutando o leito de areia branca sob a água cristalina correndo como a fresca brisa da manhã, na esperança de vislumbrar o saboroso pitéu descansando do exaustivo e prolongado esforço para cumprir o ciclo natural da reprodução da espécie ou deslizando no seu jeito sinuoso e veloz vencendo a corrente dócil, quando, alheado por instantes do seu objectivo, um vulto de tonalidade escura, meio submerso, lhe desperta especial curiosidade. Está escassos vinte metros metros da margem, muito perto do local onde termina a Avenida Rio Lima e a montante dela. A idéia inicial que lhe ocorreu foi a de que se tratava de um tronco de velho amieiro engolido na erosão da margem cujo fenómeno é banal e muito frequente nas margens arenosas do local. Depressa, porém, mudou de opinião ao constatar que a parte descoberta semelhava a proa de uma embarcação o que agitou instintivamente a sua curiosidade e o levou a considerar dar do achado conhecimento a um conterrâneo habilitado com estudos académicos na área da arqueologia.

                                           Dentro do Água-Arriba, perto do local onde descobriu as pirogas milenárias

            Confirmada, no local, a expectativa de se estar em presença de uma descoberta com interesse arqueológico foi dela dado conhecimento ao Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática
            A personagem de que tenho vindo a falar é Francisco Pinto Agra, comerciante, natural e residente em Lanheses e que, em 17 de Março de 2002, se recreava na sua barquinha na pesca desportiva do saboroso ciclóstomo, através do qual a equipa que o CNANS aqui fez deslocar obteve as primeiras informações e, desde logo, reconheceu estar-se em presença de uma descoberta de suma importância, como cientificamente se veio a comprovar.
A PIROGA Nº  4


          À primeira PIROGA foi dado o número quatro, porquanto, noutros locais do Rio Lima, desde 1980, já haviam sido descobertas outras três, duas das quais não muito afastadas do local chamado da Passagem, onde estas duas se situavam..
           Posteriormente e, na sequência das operações de resgate do primeiro achado, veio a descobrir-se uma outra PIROGA, à qual foi atribuído o nº 5.



                        A PIROGA Nº 5

            
           Tratam-se de duas pirogas monóxilas, o que significa que foram construídas a partir de um único tronco, no caso em carvalho alvarinho. A nº 4 caracteriza-se pela originalidade da proa que se assemelha a um bico ou focinho de um animal marinho, provavelmente golfinho, o que nos remete para um mito da História da Humanidade que considera este mamífero como amigo dos homens, guiador de mareantes e salvador de náufragos.
            Salienta-se naquela piroga um importante pormenor técnico que consiste numa tábua de remendo pelo sistema de encaixe, mecha e respiga, específico e típico da carpintaria naval da época clássica mediterrânica antiga, que testemunha a sua influência na carpintaria naval daqueles tempos.
            A segunda piroga descoberta perto da anterior terá sido também referenciada por Xico Agra, como vulgarmente é conhecido no meio, embora tal ainda não haja sido reconhecido oficialmente.
            O interesse desta piroga reside no facto de se encontrar em perfeito estado de conservação, presumindo-se que a sua construção haja sido abandonada já em fase adiantada dos trabalhos, em virtude de provável estalamento radial das extremidades ter levado à interrupção do seu afeiçoamento interior
            A datação dos valiosíssimos achados foi efectuada em Miami, nos Estados Unidos, pelo método de rádiocarbono, podendo estimar-se serem as pirogas de de uma época do ano 2220 a.C..

             As preciosas pirogas estão presentemente em Lisboa, a cargo do Instituto Português de Arqueologia, em virtude da sua preservação exigir condições especiais de alojamento. Está nos objectivos das entidades representativas da Freguesia de Lanheses poderem aquelas  antigas embarcações usadas pelos nossos antepassados vir a integrarem o Núcleo Museológico recentemente criado e em funcionamento nas instalações actuais daquela Junta possibilitando, deste modo, a acessibilidade fácil a uma raridade de interesse nacional e, até, mundial de que os lanhesenses muito se devem orgulhar.

              Fotografia alusiva às Pirogas de Lanheses, no Núcleo Museológico da Freguesia


           
            

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